vieiracalado-poesia.blogspot.com

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terça-feira, 4 de novembro de 2014

POEMA EM NOVEMBRO


No sem regresso das formas,
amarela lanceolada folha
sobre a terra.

Como a luz,
desnuda
o brilho opaco da nervura

enquanto a cinza
que desenha
se deslumbra.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A CINZA DA TARDE


A cinza da tarde é uma subtileza da luz
e do seu destino de fulgências breves -
engenho de cores numa ilusão doutras cinzas
para o dia fugidio, para os seus esteios.

Esconde-se e esconde os seus trâmites,
o seu trânsito das palavras ditas,
um rosário de sons pronunciados
por lábios antigos, eruditos em fábulas
e mistérios de imaginar os seus termos.

Penetra os olhos ágeis, simula o frio do ar,
a predestinação para a bruma dos ocasos,
dissimula a hábil vocação das flores
para o caminho da noite, sem ardis.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

A NOSSA CASA


Uma casa constrói-se ao lado dum caminho,
a respiração contida, a luz adequada à festa
duma porta entreaberta, grave, mas vigilante,
na virginal sedução por aromas encobertos.

Para sustentá-la em seus símbolos de fogo
e seus muros de imponderável leveza,
iludem-se os barros no plasma dos sonhos,
o tecto lavra-se para as duradoiras chuvas
em cerimónia primitiva ritual de origens.

Servem-se as ervas em remotas narrativas
de saberes esquecidos, vividos nas cinzas
do tempo breve que preencheu a claridade.

E para a necessária tolerância das ruínas
a incansável circulação dos magmas, o frio,
ignoram-se os desvios dum coração audaz

porque a casa é o lugar exacto dos ruídos
a respiração das águas que caiem devagar
desconhecendo o pó, os átomos do delírio.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

AS CORES DIZEM O TEMPO


As cores dizem o tempo,
o granizo que embranquece as arestas do granito,
o hortelã respirando pequenas flores de sabor a sul.

Ó a antiga sapiência das árvores
e dos caminhos
e da plenitude nas planícies de verdura!

Como não hei-de segredar o teu nome
ó bonina de incenso, em noites de paixão,
nos pântanos que parecem eternizar os teus segredos?

És o pólen e a cegueira
de espirais hipnóticas de paz e medo,
em águas nascentes de musgo e de frescura.

És a vertigem duns olhos feridos pelo orvalho
das manhãs, ao cair da tarde
e eu te invoco na busca dos limites
que fazem o fascínio, a vigília perturbada
do teu violoncelo tocando ao vento.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

SONETO CLÁSSICO


Subi um dia pela tarde aquele monte
donde as coisas do mundo que habitamos
fazem crer-nos, de longe, que julgamos
ver de perto, ao longe, o horizonte.

Alta serra de luz cegando a fronte,
quando ao ponto mais alto nos chegamos
das coisas do mundo comprovamos
já não ver se vemos árvore ou fonte.

E do alto da serra contemplei
em plena luz, a luz que iluminava
a terra e o sossego que reinava.

Desci depois do ponto onde cheguei,
mas só quando à terra regressei
é que entendi que vista me enganava.